Tentei soltar as cordas que sufocavam, mas o nó parecia maior do que eu. Não afrouxava, era incapaz de me deixar respirar. Mas ninguém ao meu redor estava preocupado com as minhas aflições. E eu olhava em volta diversos rostos largos e com sorrisos uniformes, feito fotografia de porta-retrato. E me atingiam aqueles sorrisos cortantes, denunciando a perfeição de uma vida rasa, que eu tentava invejar, mas faltava-me o ar até para isso. A corda não soltava, e eu era incapaz de me rebelar diante de tanta felicidade inerte ao meu redor, mas se não rebelasse a corda não rompia, e eu sabia disso e teimava em aceitar, também inerte, a condição de prisioneira. E foi tanto que a corda acostumou-se, e acostumei-me a ela. Atamo-nos, feito casamento sem cerimônias, a nossa relação de extrema dependência. Que ela só era útil enquanto servisse para privar-me da liberdade de respirar o ar que eu nem lembrava o gosto que tinha. E eu só sabia viver em meu cárcere particular, como animal privado de vida selvagem. Ensaiava pulos imaginários, fugas deslumbrantes, mas via-me prisioneiro de mim, e fugir já era assim estar sendo enganado pela minha própria ambigüidade – então sabia, que já sabia de antemão, que meu lugar era atado à corda que restringia todas as possibilidades transformando-as em apenas uma. Era pela diversidade de vôos que teimava em não decolar, tantos eram os destinos, que transformei meu único destino e ambição em ser aquilo que eu já era, mesmo sabendo que eu nunca fora aquilo, como uma equação mal resolvida. Mas a corda confortava sufocando, e prendia-me apenas a mim, fazendo com que eu sequer distinguisse quem eu era de quem eu era. Mas todos os rostos redondos me olhavam com sua insensatez digna de jovens mortais e brincavam de apertar ou afrouxar a corda. Mas eu a queria só para mim, sem variações. Os seus sorrisos transgrediam todos meus limites de contato com o mundo externo, e machucavam como agulha de vodu.
Até que fechava os olhos e ficava só de novo com meu cárcere privado. E toda aquela felicidade ingênua se apagava diante de mim, roubando-me a culpa, num fechar de olhos, por ter aberto os meus um dia.