28.9.09

TEUS CABELOS

Se eu te contar um segredo engraçado, tu ri? É que corto o cabelo sempre que troco de homem. Isso, ri. Viu, tu vai saber quando acabar pelo meu corte de cabelo. Daí tu sabe que não tem mais volta. O corte é uma mudança irreversível, mesmo que cresça de novo, é sempre um adeus tardio, prenunciado em novos fios. Sorri, tu disse que riria - meu bem, essa lágrima não é sorriso. Esse teu olho parece adeus. Vê, meu cabelo está intacto, foi só uma briga. Vê, estes fios são teus e aguardam carícia. Olha tua boca carente de sorriso e acaba estes teus braços num abraço. Que ainda conservo tus cabelos.

21.9.09

ENSAIO EM CAPS LOOK

Eu queria te dizer tanta coisa em caixa alta. Contar todos os ensaios mentais de diálogo-monólogo que me acompanham nos ônibus da cidade e nas aulas de italiano - em nenhum destes eu engulo o choro e o transformo em riso. E eu falo que a gente sabe QUE NÃO DÁ QUE JÁ CONHEÇO TUAS MENTIRAS - é nessa hora que confesso que também menti, coisa que, sabes, não vou confessar.

Eu conto das vezes em que chorei escondido em que chutei o cachorro-da-rua(sarnento) em que me entreguei a outro abraço pra esquecer. Exponho todos meus pecados silenciosos e quem cala é tu. E é tu quem disfarça e finge não ouvir - e quem quer chorar é tu.

Eu berro que AMO E VOU AMAR TODAS VEZES E QUERO MESMO QUE TODAS DOAM ASSIM E QUE EU SAIBA VIVER TODAS ELAS COM ESSE MESMO GOSTO DE RAIVA APLACADA QUE SINTO AO TEU LADO. PORQUE TUDO QUE SINTO NÃO É TEU. MINHAS NOITES INSONES NÃO TE PERTENCEM. É TUDO SÓ MEU E VAI CONTINUAR SENDO QUANDO ALGUM OUTRO CORPO OCUPAR TEU POSTO.

Mas nessa hora lembro que era apenas mais um ensaio mental, outro diálogo-monólogo não pronunciado. E que queria tanto te falar tudo isso. Em caixa alta.

14.9.09

TALVEZ O JOELHO LATEJANTE

Dói caminhar machucada assim como estou. Mas que é da vida sem dor? Tão falsa, a única verdade é essa. A única verdade, talvez o joelho latejante, nunca latente. Apenas algumas escadas a mais e alcanço aquele apartamento (maldito medo de elevador), ainda sem saber explicar direito a perna manca. Treino algumas mentiras realistas demais para serem verdade. Na hora, conto tudo milimetricamente como ocorreu - depois me xingo por não saber mentir.

Ele ri da confusão deste plano real onde vivo e acende um baseado, enquanto busca gelo para afinar minha dor. Feio, hein? Rio e declino o fumo que me oferece.

Ficamos assim, os dois com as cabeças baixas, pensando na minha impotência em mentir. Ele ri às vezes pensando em como lhe era fácil uma vida de segredos; noutras fica quieto, invejando meu dom de ser eu.

Ficamos assim, os dois com as cabeças baixas. Talvez uma vida inteira.

7.9.09

AQUELES 30 CENTAVOS

Eu não sabia se era pobreza ou ceticismo, mas alguma coisa me dizia que ele não valia os 30 centavos de uma mensagem de texto. Então digitei e não mandei. Claro, eu poderia escrever longos textos em uma mensagem de texto, mas aquela tinha o que? Cinco ou seis palavras que já esqueci e, se lembrasse, pouco diriam.

Mas o estranho do fato era isso partir de mim, que era sempre em tempo real. Logo eu, que era um sim materializado, nunca formulando as três letrinhas negativas. Logo eu, que semana antes tinha dito que amava para sempre, como eu sempre dizia e sempre acreditava, também. Agora, de repente, não valia aqueles 30 centavos. Fossem 20, talvez, as coisas tivessem sido diferentes. Talvez eu respondesse uma resposta bonita e talvez naquela mensagem tivesse meu final feliz, aquele casal de gêmeos de olhos azuis que carregaríamos numa tarde de domingo. Não, esse não era o meu final feliz.

Quem decide os preços dessas mensagens, talvez, nunca vá saber quantos destinos selou. 10 centavos, eu penso, certamente valeria aquela resposta. Aquele homem com cara de menino valia 10 centavos. Quase todos valeriam, exceto, talvez – e friso este talvez - os que já tinham desvalorizado.

Mas bate agora uma aflição desinteressada, quase um remorso de mim. E é num desses pensamentos cotidianos que prefiro pensar que estou ficando pobre.