20.12.10

NA METRÓPOLE

ela mora na metrópole e tem os pés sujos de suor e indiferença. na metrópole é música a buzina do carro antigo e o elevador do prédio que insiste em subir e descer sempre que chamado. e é música também a música, essa mistura de sons que sai do apartamento dos vizinhos e ingressa sem permissão no seu.

na metrópole não é permitido escolher. as coisas apenas estão e sua cabeça deve ser movida 90º acima e 90º abaixo sempre em aprovação. a metrópole não tem rosto e quando sai de casa caminha 7 quadras até o metrô lotado que lhe leva ao trabalho sempre no mesmo pontual horário e 5 paradas depois desce na estação trabalho caminha meia quadra peatonal busca as chaves na bolsa e sempre demora a encontrá-las mas encontra e abre a porta e entra chama o elevador e sobe até a oficina X do 80º andar onde continua sendo apenas sujeito de verbos por mais 8 horas, quando não vocativo de algum xingamento.

o relógio sabe então dar-lhe alforria ao final de cada dia, quando seus ponteiros estiram-se lentamente, um em oposição exata ao outro, formando uma vertical reta perfeita. e nessa linearidade ela sabe que é livre, daquela liberdade que as metrópoles tem. e nessa hora em que passa já despreocupada pelas bancas de revistas, lê mais um assassinato e dessa-vez-não-fui-eu-que-sorte-veja-só. e pensa em telefonar para alguém, mas não há ninguém para ligar e são-só-vinte-quadras-vou-caminhando.

na metrópole ela é invisível. e quando chega em casa, sorri.

13.12.10

PORTUÑOL

De repente não havia mais ninguém. Tudo olvidado no momento do check in. Esta sempre fora minha casa – ou talvez faça só um mês, conto mentalmente com esta nova noção de tempo cujos dias da semana podem também ser encontrados no planetário. E o planetário, este antigo companheiro, não está mais ubicado ao lado da faculdade que também deixei de frequentar.

Sim, faz só um mês, respondo ao policial que, desconfiando deste pelo loiro e dessa pele branca misturadas ao sotaque brasileiro indaga se já tenho minha identidade. No, no la tengo, verdad. Solo voy a tenerla en enero, sem importar-me com a correção gramatical.

Quando saio dali percebo o tempo que cabe dentro de um mês, o que inclui, já te disse, segundos seculares e dias que correm, assim com essa velocidade que só o tempo sabe que tempo tem. E é nessa velocidade de dias que bajo del subte, camino cuatro cuadras hasta que sé yo e paro. É o Brasil que me chama em 140 caracteres na tela do celular. Aquela palavra que sempre acreditamos tão brasileira me invadindo agora, plena 9 de Julio.

Se não obteve resposta, minha desculpa unânime sempre será este sinal inconstante de celulares porteños. Impossível expressar assim, tanta distância e tão pouco espaço, o estranhamento de não extrañarte.

6.12.10

Haicai para Maria Clara

Grande confusão verbal
aprendeu a palavra titia
com uma câmera digital