30.8.10

ROSA-E-ROXO

Às vezes eu olhava e sabia que era somente uma flor que abusava da mistura rosa-e-roxo para chamar a atenção. Quase sempre era assim já e meu olho costumava até a não vê-la, na pressa dos tempos. Mas, naquela manhã, depois de cinco dias em uma rotina de vômito e fezes, encontrar a flor para a qual eu fazia pedidos na infância me pareceu um sinal.

É verdade que quando criança minha história variava de acordo com o humor. Para algumas amigas dizia que dava sorte - e só. Para outras, indicava que fizessem desejos e a planta se encarregaria de torná-los reais. Para todas, porém, reforçava que deveriam guardar a flor.

Naquele dia, ao encontrá-la na saída do hospital, não soube escolher uma das virtudes atribuídas à planta. Por via das dúvidas, fiz um desejo e saí comemorando sorte, com ela no bolso, sem medo de parecer criança.

23.8.10

METRÔ

às vezes eu penso que o metrô é um fluxo contínuo. às vezes eu penso que o metrô está dentro do meu próprio corpo - é aquela chaga purulenta que não cicatriza nem dói. confesso minha vontade de parar em meio à estação para ver se o fluxo pára também -
............................................................................................................................mas o que acontece se o fluxo pára (sei lá) meia hora?
param também, por acaso ou rebeldia, os ponteiros dos relógios?
e a chuva na rua, que fará?
(se todos estão lá, parados, a chuva não os pode molhar.) porque você sabe, parando os relógios as fábricas param também. não se produz mais café, energia ou força de trabalho.


.eis que me dou conta: o metrô pára também. (ah, se um dia eu parasse aquele fluxo, quem sabe congelava o riso banguela no rosto da maria? quem dirá que não parei a morte no encalço de seu antônio? e talvez a juliana tivesse para sempre o namorado ao seu lado.)


às vezes eu penso que o metrô é um fluxo contínuo. às vezes eu penso que o metrô está dentro da vida - e que só depende de mim.